19.
ANO NOVO EM PARIS
(fatos ocorridos entre 1965
e 1966)
Comecei
a caminhar pela avenida e, aos poucos, fui me relaxando e
aproveitando a oportunidade para observar Paris ao anoitecer.
Enquanto caminhava fui estudando um prédio moderno com uma
enorme torre em cima. Andei mais alguns quarteirões
e parei embasbacado, a tal torre era a Torre Eiffel. Eu estava
de frente para a Torre Eiffel, incrível! De longe pude avistar
a Varig, pois a loja era ampla, toda envidraçada e com um
enorme letreiro. Quando cheguei em frente à loja olhei pelas
vidraças e pude ver meu primo sentado em uma enorme poltrona,
com uma chícara de café esfumaçante nas mãos. Ao me ver ele
apenas disse: Ôi Lupércio, você veio?
Me
deu vontade de matá-lo ali na hora, mas depois fiquei sabendo
que eles estavam tentando se comunicar com a embaixada brasileira
em Belgrado e que o Marco tinha que ficar ali, aguardando
a comunicação. Então expliquei que a velha estava guardando
nossas malas e me sentei em outra enorme poltrona e me deliciei
com um cafezinho bem quente. A Varig era fantástica... Não
conseguimos contato com Belgrado, então o pessoal da Varig
nos levou a um hotel bem simples, chamado Hôtel du Galilee,
onde se hospedavam suas tripulações. Teríamos que passar três
dias ali, antes de embarcarmos para a Iugoslávia.
Os
donos do hotel eram um casal de velhinhos muito simpáticos,
embora falassem um francês bem enrolado. O hotel, muito bem
localizado, fica na Rue du Galilee, a dois quarteirões da
Avenida dos Campos Elíseos Deixamos nossas malas no hotel
e saímos, mortos de fome, para comer alguma coisa. Acontece
que era a noite da passagem de ano e, ao contrário dos brasileiros,
os franceses não passam o reveillon em casa, fazem reservas
com meses de antecedência e lotam todos os bares, lanchonetes,
restaurantes, boates e outras casas do gênero.
Andamos
por horas pelos Campos Elíseos e redondezas sem nada encontrar,
quando os relógios marcaram a passagem do ano nós retornamos
ao hotel e, pela nossa fisionomia, a velhinha, dona do hotel,
percebeu o que ocorrera. Falou conosco bem devagar, para que
entendêssemos, dizendo que fôssemos para o apartamento que
ela ia ver se tinha alguma coisa em sua geladeira. Subimos
os cinco andares pelo pequeno elevador, olhando um para o
outro sem acreditar no que acontecera, era um milagre!
Entramos
no quarto e nos comprometemos a dividir irmamente qualquer
coisa que a velhinha trouxesse. Ela bateu na porta e quando
a abrimos ficamos pasmos, a boa velhinha trazia dois enormes
copos de leite quente, acompanhados de oito croassants, os
deliciosos pãezinhos franceses, com bastante manteiga. Comemos
bem devagar, para não fazer mal, e fomos dormir agradecendo
a Deus.
Nos
dias seguintes passeamos por toda Paris, constatando que nossos
sapatos, roupas e agasalhos, de fato, não foram feitos para
o frio do hemisfério norte. Paris é bela, principalmente quando
se anda a pé, entrando em cada beco, em cada vila, lugares
onde os turistas nunca aparecem. Depois de três dias em Paris,
embarcamos para Belgrado, na companhia aérea estatal da Iugoslávia
(Air Jugoslav). Que diferença...
Para
começar não lanchamos, para poder lanchar a bordo e economizar
nossos centavos. Depois de alguns minutos de vôo serviram
duas bananas para cada passageiro. Isto é que é socialismo?
Estou começando a desistir... Comemos as bananas verdes olhando
um para o outro e pensando: Será que é só isso? Era. Nossa
única escala foi em Zágreb, segunda cidade da Iugoslávia,
onde ficamos duas horas em pé em um salão fedido e congelado
enquanto eles revistavam a nossa bagagem. Minha mala ficou
um lixo!